Telma Miranda





Epigrama nº 9

O vento voa,
a noite toda se atordoa,
a folha cai.

Haverá mesmo algum pensamento
sobre essa noite? sobre esse vento?
sobre essa folha que se vai?

Cecília Meireles



XXIV

Somos folhas breves onde dormem
aves de sombra e solidão.
Somos só folhas e o seu rumor.
Inseguros, incapazes de ser flor,
até a brisa nos perturba e faz tremer.
Por isso a cada gesto que fazemos
cada ave se transforma noutro ser.

Eugênio de Andrade




"O que sou hoje, nesse momento? Uma folha plana, muda, caída sobre a terra. Nenhum movimento de ar balançando-a. Mal respirando para não se acordar."

Este último trecho de Clarice Lispector está em "Perto do coração selvagem", seu primeiro livro, publicado em 1944, cuja leitura recomendo com urgência. No primeiro capítulo, Joana, ainda criança, diz a seu pai que inventou uma poesia:

"Vi uma nuvem pequena
coitada da minhoca
acho que ela não viu."

O pai, então, pergunta: "Como é que se faz uma poesia tão bonita?". E Joana responde: "Não é difícil, é só ir dizendo."
Também resolvi "ir dizendo"...


Somos folhas breves
- quase nada -
onde repousam
sombras
secreção
sementes

Somos plenos
e faltosos

E a cada gesto
trêmulo
infértil

Mais nos abismamos
em nada ser e tudo querer.

Telma Miranda
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