Telma Miranda

 Ler Clarice é um mistério. 

É como se houvesse uma morte e renascimento ao mesmo tempo: morrendo e me parindo nas palavras escritas por Clarice. 

Um mistério até o dia em que sabemos que não há mistério algum. É muito simples. 

Simplesmente acontece. 

Estou em uma rua de pedestre, me desviando de pessoas e bolsas, ouvindo os "comerciais" dos camelôs. Páro diante de uma banca de jornal e olho distraída as revistas expostas.  Desvio o olhar por nenhum motivo e encontro aqueles olhos azuis. Sim. Azuis, mas muito tristes. Tão tristes que me entristeço rapidamente. Ele me olha, mas não me vê. É tudo muito rápido e em algum momento entre a tristeza do olhar e meu entristecer percebo que são olhos de um manequim colocado na porta da loja. Tudo muito rápido, mas eu vi. Como Clarice, o não-olhar do cego. E me vi nele: ele era eu. Aquela tristeza era minha. Sua paralisia, inocência, serenidade me davam outras dimensões de mim.E soube ali que amava. 




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